domingo, 30 de dezembro de 2012

novo ano


Aquele ano voou. A semana passava veloz como o dia e os meses eram semanas.
Estava tudo passando tão rápido e parecia que acelerava ainda mais, de acordo com a percepção que eu começava a ter da minha velhice.
Depois de uma época na vida, você descobre um grande segredo e uma grande assombra: somos perecíveis. Temos prazo de validade. Não nós apenas, como tudo a nossa volta. E foi ao descobrir isso que comecei a perceber a vida de outra forma.
Comecei a sentir a pele mudar, os traços se modificarem, o cabelo ficar mais fino. E todas essas transformações eram velozes como o tempo que passava por mim.
Junto com o sentimento de velhice, veio a velha e conhecida solidão. Os amigos que partiam para longe e os sorrisos que ficaram ainda mais preciosos por serem tão passageiros.
Naquele ano que passava ligeiro e cheio de novas percepções, os dias não pareciam colaborar. Eram cada dia mais cinzas e chuvosos. Dias escuros que eu achava tão singular em sua beleza tão triste.
Tomada pela tristeza dos dias, resolvi começar a dormir o dia todo. Ao abrir os olhos, depois de um sono prolongado, vi o que há muito tempo não via; o sol.
Ele entrou pela fresta da janela, desenhou um risco sobre a colcha, sobre o meu corpo, sobre o armário.
De tanto estremecimento pelo contato daquele calor repentino, desenhei no ar de sol, formas com o meu dedo. E enquanto eu dançava com as mãos no ar, dançava  também a poeira.
Sorri, na brevidade de uma nova paixão. Eu deitada, sentindo a vida me tocar.
Girei as pernas debaixo do lençol (senti acariciar a minha pele) e abri a janela.
Lá estava! A vida azul e amarela, novamente.
Saí para a rua, curtindo a sensação de não saber para onde ir. Mas queria eu continuar. Parei em uma praça e foi lá que percebi o quanto me amedrontei durante anos. As pernas travavam nas danças coladas ao corpo masculino, quando na verdade era muito mais fácil ser levada. 
E os outros também participavam do baile contínuo, a vida.
Duas senhoras conversavam sobre liberdade e solidão. Desejavam uma casa na praia para ir aos fins de semana, desacreditavam no amor. Homens não prestam, diziam elas.
Até o pão mofado tem um lado bom para se comer. Valerá a surpresa da indigestão?
Próximos de mim, um grupo de homens e mulheres já bem idosos, conversavam sobre música. Um senhor de olhos brilhantes, cantava como os antigos cantores de rádio. Músicas românticas, como as que as senhoras que maldiziam os homens, cantavam em seus quartos, sonhando com o que não foi.
E as pessoas iam e vinham naquela praça do dia ensolarado. E tudo que era belo e feio, ia também. E tudo o mais ficava em mistério.
               
Anita Correa. (escrito em 2009) 

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